Publicado por: Djalma Santos | 26 de fevereiro de 2011

Clonagem gênica

Clonagem gênica (técnica do DNA recombinante ou engenharia genética) consiste na inserção de um segmento selecionado de DNA (DNA doador ou inserto) em um plasmídio ou no cromossomo de um bacteriófago, que atuam como vetores de clonagem, e posterior replicação desse DNA recombinante em um hospedeiro apropriado, como uma bactéria ou uma célula de levedura. Essa replicação ocorre quando o sistema de síntese do DNA do hospedeiro replica o DNA inserido na célula hospedeira. Dessa forma, a partir de uma dessas células transformadas são obtidas, graças à divisão celular, um grande número de células idênticas (clones), cada uma dotada de várias cópias do DNA recombinante (figura abaixo).

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O clone, uma vez formado, pode ser sequenciado e comparado com outras sequências já descritas; ser utilizado no estudo da expressão gênica do(s) gene(s) contido(s) no clone; ser alterado especificamente por mutagênese sítio dirigida ou ser usado para gerar um produto de interesse comercial.

As técnicas de engenharia genética, área importante da biotecnologia, manipulam, portanto, as células para exprimir e/ou alterar genes clonados. Essa tecnologia, envolvendo multiplicação de fragmentos selecionados de DNA, tem levado a produção de várias proteínas humanas de interesse médico, como fatores de coagulação sanguínea, antitrombina, albumina sérica humana, hormônio de crescimento, gonadotropina humana, interleucinas, interferons e insulina, que foi a primeira proteína humana produzida através dessa tecnologia em bactérias e aprovada para uso em humanos. Através dessa tecnologia, podem ser obtidas, também, proteínas que servirão para a produção de vacinas (heptatite B, herpes, gripe, malária, etc.). Neste contexto, a produção de vacinas contra o vírus HIV, por exemplo, representa uma esperança para o controle da AIDS.

A pecuária e a agricultura também têm sido beneficiadas pela clonagem gênica. A introdução de genes em animais e plantas tem favorecido a cura de doenças genéticas, aumentado a produtividade das plantas e do gado e tornado cereais mais resistentes a doenças diversas. Assim sendo, plantas têm sido modificadas para torná-las resistentes a insetos e a plantas infestantes. Trabalhos vêm sendo feitos no sentido de introduzir em alguns cereais (trigo, arroz, cevada, milho, etc.) genes bacterianos capazes de transformar o nitrogênio atmosférico em amônia (fixação biológica do nitrogênio). Esses trabalhos permitirão o crescimento dos cereais sem a necessidade de adição de fertilizantes de nitrogênio, muitas vezes prejudiciais ao ambiente, além de bastante dispendiosos. Outra conquista da biotecnologia aplicada à agricultura foi a possibilidade de manipular geneticamente a resistência a pestes em plantas, visando reduzir sua dependência de pesticidas químicos.  O gene codificador da toxina capaz de matar larvas de certas pragas de insetos foi isolado da bactéria Bacillus thuringiensis e transferido para o tomate, o milho, a batata e plantações de algodão. Dessa forma, quando o gene é expresso produz a toxina inseticida, levando à morte as larvas que comem a planta.

A recombinação entre moléculas de DNA de diferentes organismos é um fenômeno comum na natureza. Alguns fagos, por exemplo, têm a capacidade de inserir seu genoma no cromossomo da Escherichia coli, mudando o conteúdo genético da célula. Vez por outra, ao receber nova informação genética do vírus, uma bactéria pode se tornar patogênica. Essa modificação genética provocada por vírus, denominada conversão lisogênica, é um exemplo de engenharia genética presente na natureza.

Uma clonagem de genes envolve cinco componentes principais, relacionados no quadro a seguir.

COMPONENTES

FUNÇÃO

DNA doador (inserto)

Fonte do gene a ser clonado.

Endonuclease de restrição

(tesoura genética)

Enzima usada para cortar o DNA doador e o DNA do vetor em locais específicos, de modo que o gene a ser clonado possa ser inserido no vetor.

Vetor de clonagem

Plasmídio ou “cromossomo” de bacteriófago usado para introduzir o gene a ser clonado numa célula hospedeira apropriada.

DNA ligase

Enzima usada para unir as extremidades livres e adaptáveis (coesivas, adesivas ou “pegajosas”) do DNA do vetor e do DNA doador, formando um vetor recombinante.

Célula hospedeira

Célula na qual o vetor recombinante é introduzido de modo a obter grandes quantidades da molécula de DNA recombinante. Geralmente é uma bactéria ou uma célula de levedura.

ENDONUCLEASE DE RESTRIÇÃO (ENZIMA DE RESTRIÇÃO)/OPERÁRIA DA TECNOLOGIA DO DNA RECOMBINANTE

Em bactérias, as endonucleases de restrição (tesouras genéticas), assim denominadas por cortarem sítios restritos no interior do DNA em dupla-hélice, fazem parte de um sistema de proteção contra infecção por bacteriófagos (vírus que atacam bactérias), também conhecidos como fagos. Graças a essas enzimas, descobertas no final dos anos 1960, o DNA viral injetado na bactéria pode ser destruído antes que se duplique, protegendo-a contra DNAs estranhos. As bactérias, por seu turno, também sintetizam enzimas, como a DNA metiltransferase, que, adicionando o grupo metil (grupo protetor) ao DNA cromossômico (DNA bacteriano), as protegem de suas próprias endonucleases de restrição (figura a seguir). Há, portanto, um sistema que protege a bactéria contra a entrada de informação indesejável (DNA estranho) e ao mesmo tempo protege da sua própria informação evitando que o seu DNA se degrade. Na tecnologia do DNA recombinante, as enzimas restrição são usadas para se obter, com precisão, fragmentos bem definidos de DNA a fim de serem implantados em outras moléculas de DNA cortadas pela mesma enzima. Dessa forma, o uso apropriado dessas tesouras genéticas permite, em face do corte ser realizado em regiões definidas, o isolamento de fragmentos discretos de DNA, uniformes em tamanho e capacidade de codificação.

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Atualmente são conhecidas e catalogadas centenas de enzimas de restrição entre as quais citamos: BamHI, EcoRI, HindIII, AvalI, AluI, BglII, PstI, BalI, SmaI, HaeIII, TaqI, HhaI e SalI (denominações derivadas das estirpes bacterianas a partir das quais foram isoladas). Elas são isoladas das bactérias, comercializadas por grandes empresas da área de Biologia Molecular e cortam o DNA dentro de uma sequência específica de 4 a 8 pares de bases (pb), denominada sequência de reconhecimento (sítio de restrição). Dessa forma, moléculas idênticas de DNA, quando tratadas com determinada endonuclease de restrição, são cortadas nos mesmos pontos, gerando fragmentos de mesmo tamanho, com duas extremidades adesivas. O quadro abaixo mostra a sequência de reconhecimento (sequência de corte no DNA) de três dessas enzimas (BamHI, EcoRI e HindIII).

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A figura a seguir mostra, esquematicamente, como as enzimas de restrição agem na engenharia genética. Elas reconhecem e atuam sobre sequências específicas do DNA, catalisando a quebra de uma ligação fosfodiéster entre dois nucleotídeos consecutivos ligados a determinadas bases. Um corte num fragmento de DNA por uma enzima de restrição forma fragmentos com extremidades coesivas. Os cortes tanto no DNA inserto, gerando o segmento enxerto, quanto no DNA vetor devem ser feitos pela mesma tesoura genética, portanto no mesmo sítio de reconhecimento. Em função disto, aparecem extremidades soltas complementares capazes de se ligarem. O resultado da união, feita pela DNA ligase, é um DNA recombinante (molécula híbrida), constituído pelo vetor e pelo gene enxerto, proveniente do DNA inserto.

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VETOR DE CLONAGEM

Um vetor de clonagem (carreador de gene para uma célula hospedeira) é uma molécula de DNA à qual genes estranhos (insertos) podem ser ligados, formando um DNA recombinante (figura abaixo), e, posteriormente, inserido nas células hospedeiras, onde se replica. Ele é, portanto, um propagador de inserto no hospedeiro. Vários tipos de vetores podem ser utilizados nas experiências de clonagem. Os mais frequentes, contudo, são os plasmídios e os vírus bacterianos (vírus transdutores), pelo fato de serem facilmente introduzidos nas células e facilmente manipuláveis no laboratório.

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Plasmídios ou plasmídeos (figura a seguir), cujo número varia de1 a 100 cópias por célula, são pequenos DNAs circulares (1 a 400 kpb) de cadeia dupla e extracromossomiais (separados do DNA cromossômico).

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Cada plasmídeo contém uma sequência de DNA que serve como origem de replicação ou ori (ponto de início da replicação) que torna sua duplicação independente da replicação do DNA cromossômico. Os plamídeos ocorrem naturalmente em muitas bactérias e, a exemplo do cromossomo bacteriano, presente no nucleoide, também veiculam informações genéticas. Embora possuam genes para a própria replicação, eles não são, em condições normais, essenciais para a sobrevivência da célula, podendo ser perdidos sem causar a morte celular. Na figura abaixo, que é o diagrama de um plasmídio, observamos, além da região de inserção do gene a ser clonado, e da origem de replicação (ori), o gene seletivo ampr condificador da enzima b-lactamase, que inativa a amplicilina (antibiótico). Ressaltamos que, além dos genes citados (ori e ampr), a grande maioria dos plasmídios, possui informações genéticas que codificam para outros antibióticos (tetraciclina, estreptomicina, etc.), para toxinas, para resistência a metais pesados, etc. A região ori é essencial, como vimos anteriormente, para a sua replicação autônoma, assegurando, dessa forma, a sua transmissão à descendência da célula bacteriana. É necessário, portanto, que essa região não seja alterada durante a clonagem. A presença de um fator de resistência a um antibiótico, como o gene ampr, é também muito importante para o sucesso da clonagem, já que ele atua como uma forma de marcador para seleção de células contendo o plasmídio. Assim sendo, células portadoras do vetor (portadoras do DNA recombinante) são capazes de sobreviver em meio de cultura contendo o antibiótico, enquanto as células não infectadas (desprovidas do DNA recombinante) não são viáveis. Os plasmídios são, sem dúvida, os vetores de clonagem mais usados.

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O material genético dos bacteriófagos (principalmente do fago lambda), vírus que infectam bactérias e também usado como vetor de clonagem, possui genes essenciais para sua reprodução, a exemplo dos plasmídeos, bem como genes que não se relacionam diretamente com a multiplicação viral. Os primeiros se situam, via de regra, nas extremidades do DNA viral, enquanto os que não se relacionam diretamente com a reprodução, localizam-se na região mediana. Essa distribuição facilita a ação das enzimas de restrição, que, separando os dois grupos de genes, permite a introdução, no lugar dos genes não essenciais à reprodução viral, do gene a ser clonado. A molécula recombinante é, então, introduzida em fagos vazios que são então utilizados para infectar bactérias e propagar o gene de interesse. É, dessa forma, que muitos pesquisadores utilizam vírus modificados como vetores para transporte, inclusive, de genes terapêuticos.

Independentemente do tipo, os vetores devem possuir certas características que se adequem à clonagem. A tabela a seguir mostra algumas dessas características.

CARACTERÍSTICAS

FUNÇÕES

Serem estáveis na célula hospedeira Permite a replicação
Controlarem a sua própria replicação Permite a sua replicação dentro da célula com um elevado número de cópias
Possuírem pequenas dimensões Permite uma rápida introdução na célula
Serem cortados em um só local por uma enzima de restrição Permite a inserção do DNA doador e a circularização do sistema recombinante
Não serem transferidos por conjugação Evita que o DNA recombinante se dissemine para as populações naturais de bactérias
Terem características facilmente detectáveis (marcadores seletivos, como resistência a anbibióticos) Torna possível distinguir as células transformadas das não transformadas
Serem facilmente isolados das células Aumenta o rendimento dos sistemas recombinantes

LIGAÇÃO

Preparadas, in vitro, as moléculas de DNA que se pretende recombinar, promove-se a ligação. Considerando-se que o vetor de clonagem e o fragmento de DNA inserto tenham sido clivados pela mesma tesoura genética, a compatibilidade das extremidades coesivas (adesivas ou pegajosas) formadas, torna possível o emparelhamento entre as bases complementares, através das pontes de hidrogênio. A figura abaixo mostra essas extremidades após clivagem pela enzima de restrição EcoRI. Como se pode constatar, as extremidades coesivas apresentam um pequeno número de nucleotídeos em cadeia simples que permite sua união com outro fragmento de DNA pela complementariedade das bases.

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Por fim, graças à ação da DNA ligase ocorre a ligação covalente (ligação fosfodiéster, mas precisamente ligação 3′-5′ fosfodiéster) entre os dois nucleotídeos das extremidades das duas moléculas a serem unidas. A ação da DNA ligase consiste em catalisar a união entre o grupo fosfato ligado ao carbono 5′ e o grupo hidroxila ligado ao carbono 3′ das moléculas de desoxiribose presentes no DNA (figura a seguir), numa reação que requer ATP.

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CÉLULAS HOSPEDEIRAS

Algumas estirpes bacterianas e de levedura foram propositadamente desenvolvidas para serem utilizadas na clonagem gênica. Para que um dado plasmídio, por exemplo, se replique nas células hospedeiras, elas devem reconhecer a origem de replicação (ori) do vetor de clonagem e nem todos eles possuem a mesma origem de replicação. Com o intuito de reduzir a probabilidade de infecções acidentais de pessoas que trabalham nos laboratórios de biotecnologia, bem como da população em geral, as células hospedeira não devem se reproduzir na natureza. Visando impedir a disseminação do DNA recombinante nas populações naturais dos organismos, deve-se, também, evitar a transferência desse DNA de uma célula hospedeira para outra.

A escolha da célula hospedeira está, via de regra, relacionada com o objetivo da clonagem. Se a intenção é promover uma análise estrutural do gene isolado, deve-se, preferencialmente, utilizar um sistema simples que seja fácil de usar. Se o objetivo, por outro lado, é expressar as informações genéticas em grandes eucariotos, deve-se utilizar sistemas mais específicos. Esses dois objetivos, entretanto, não são mutuamente exclusivos. Com relativa frequência, um hospedeiro primário simples é usado para isolar a sequência desejada, que, em seguida, é introduzida em um sistema mais complexo, onde se expressa.

A figura abaixo mostra, esquematicamente, os eventos básicos em uma experiência de clonagem gênica.

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1. Um fragmento de DNA contendo o gene a ser clonado é inserido em um vetor de clonagem, geralmente um DNA circular, formando uma molécula de DNA recombinante.

2. Introdução da molécula de DNA recombinante na célula hospedeira.

3. Multiplicação da molécula de DNA recombinante no interior da célula hospedeira, formando várias cópias idênticas, processo conhecido como amplificação.

4. Divisão da célula hospedeira e consequente passagem para a prole, de cópias da molécula de DNA recombinante.

5. Formação de um clone, colônia de células cada uma contendo cópias múltiplas da molécula de DNA recombinante, graças a sucessivas divisões celulares.

Dentre as colônias transformadas com o vetor recombinado é necessário selecionar aquelas que contêm, de fato, o gene de interesse, excluindo, assim, aquelas que não contêm o vetor ou contêm o vetor vazio. Essa seleção é feita através de genes marcadores contidos no vetor, como foi mencionado acima.

Reiteramos que as bactérias, em especial a Escherichia coli, são bastantes usadas como hospedeiras na clonagem, constituindo-se um dos principais materiais biológicos utilizados na tecnologia do DNA recombinante. Essa preferência se deve, principalmente, ao fato de elas se multiplicarem rapidamente num meio de crescimento normal de laboratório e dos seus genomas já serem bastante conhecidos. Entretanto, elas nem sempre se mostram adequadas para todos os tipos de experiências de clonagem. Há situações em que a clonagem e a expressão de genes se realizam melhor em um hospedeiro eucariótico. Nestes casos, a levedura, Saccharomyces cerevisae, tem sido o organismo escolhido. Essa levedura é provavelmente o melhor caracterizado de todos os eucariontes. Ela vem há séculos sendo utilizada na produção de pão e de cerveja e cresce bastante bem, a exemplo da Escherichia coli, nas condições normais de laboratório, em meio de cultura líquido. Possui um genoma de aproximadamente 2 x 107 pares de bases contidos em 17 cromossomos lineares e algumas estirpes são dotadas de um tipo especial de plasmídio de 2μm, como é  conhecido, que possui 6318 pares de bases. Nas células, o número de cópias desse plasmídio varia entre 70 e 200.

INTRODUÇÃO DO DNA RECOMBINANTE NA CÉLULA HOSPEDEIRA

A introdução do DNA recombinante na célula hospedeira pode ser feita por vários métodos, dos quais citamos: eletroporação, lipofecção e co-precipitação (precipitação com fosfato de cálcio).  A escolha do método é feita de acordo com a patologia, a célula ou tecido-alvo, o tamanho e tipo de transgene (gene de interesse) a ser expresso e o tempo e quantidade de expressão que se deseja obter, entre outros fatores.

I. Eletroporação

O método usado em muitos laboratórios para introduzir moléculas de DNA recombinantes nas células hospedeira é a eletroporação (figura a seguir). Essa técnica consiste, em linhas gerais, em misturar uma suspensão de células hospedeiras, em fase exponencial de crescimento, com uma suspensão da molécula do DNA recombinante (DNA a ser transferido), submetendo-se, em seguida, o complexo a pulsos elétricos curtos (pouco milissegundos) de alta voltagem. A corrente gerada altera a estrutura da membrana celular, abrindo poros temporários aquosos (aquaporinas) na bicamada lipídica que possibilitam a entrada do DNA recombinante na célula-alvo. O método requer um equipamento denominado eletroporador, que deve ser ajustado para cada tipo de célula, considerando parâmetros como capacitância, intensidade e duração do pulso elétrico. Altos níveis de permeabilização facilitam a entrada de DNA, mas diminuem a viabilidade da célula. Assim sendo, é necessário que se estabeleça uma curva de viabilidade da célula em relação aos parâmetros aplicados. A grande utilização desse método se deve ao fato de ele ser rápido e eficiente, especialmente quando se introduz DNA em células de difícil transformação.

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II. Lipofecção

Na lipofecção, a introdução do DNA recombinante ocorre através de pequenas vesículas esféricas formadas por bicamadas concêntricas de  fosfolipídios conhecidas como lipossomos (figura abaixo). Elas são análogas à membrana plasmática e se organizam “espontaneamente” em meio aquoso. A flexibilidade estrutural, seja no tamanho, na composição e na fluidez da bicamada, bem como a sua capacidade de incorporar uma variedade de compostos tanto hidrofílicos como hidrofóbicos, fazem dos lipossomos excelentes condutores do DNA recombinante.

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Como se pode constatar na figura a seguir, os lipossomos se fundem com a membrana celular e depositam o DNA recombinante diretamente no interior das células hospedeiras.

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III. Co-precipitação (precipitação com fosfato de cálcio)

Este método foi um dos primeiros sistemas descritos e apresenta algumas vantagens pela segurança, simplicidade e custo. Ele se baseia no fato de que as células absorvem de forma eficiente o DNA quando este forma um precipitado com fosfato de cálcio. Desse modo, quando cloreto de cálcio é adicionado ao DNA, que está diluído em tampão fosfato, forma-se um precipitado de fosfato de cálcio e DNA, que é absorvido pelas células em cultura (figura abaixo). Embora seja um método muito simples, sua reprodutibilidade e eficiência são muito baixas. A taxa de transferência é de apenas uma em cada 105 células.

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Apesar de algumas células, como os linfócitos, apresentem resistência à transfecção com precipitados de fosfato de cálcio, esse é um dos métodos mais usados na introdução de DNA em células de mamíferos.

APLICAÇÕES DA ENGENHARIA GENÉTICA

Entre as “áreas” nas quais a técnica do DNA recombinante tem provocado maior impacto, citamos:

I. Estudo da estrutura dos genes, importante para compreender os mecanismos que regulam a expressão de um determinado gene em um tecido e para deduzir a função do gene a nível molecular. A engenharia genética possibilita, igualmente, o estudo de anormalidades genéticas, como alterações em oncogenes e em genes supressores de tumor.

II.Obtenção de Organismos Geneticamente Modificados (OGMs). Organismos em cujo genoma foram introduzidos genes que conferem características desejadas. Eles são dotados, portanto, de alteração(ões) em trecho(s) do seu genoma obtida(s) através da tecnologia do DNA recombinante.  Dentre as utilizações dos OGM citamos:

a) produção de alimentos em maior quantidade e qualidade;

b)produção de grandes quantidades de substâncias com aplicação médica ou farmacêutica, como insulina, hormônio do crescimento e fatores de coagulação sanguínea;

c)produção de substâncias com aplicação industrial;

d) biorremediação -modificação de organismos no sentido de degradarem poluentes.

A utilização e a introdução no mercado dos OGMs é um assunto controverso e que levanta problemas éticos. Apesar das vantagens associadas a esses organismos, o impacto sobre o ambiente e a saúde humana decorrente de sua utilização é, ainda, desconhecido e imprevisível.

III. Teste de paternidade. A comparação das impressões digitais genéticas dos progenitores e do(s) descendente(s) permite excluir a paternidade ou confirmá-la com um elevado grau de certeza.

IV. Investigação forense – permite a identificação de suspeitos a partir de material deixado num local, como cabelo, sangue, esperma, etc. Permite, igualmente, a identificação de cadáveres.

V. Aconselhamento genético. Processo pelo qual paciente(s) e/ou parente(s) portador(es) de uma doença ou com o risco de ter uma doença hereditária são informados acerca da natureza da doença, da probabilidade ou risco de desenvovê-la e transmiti-la à próxima geração, bem como das formas de preveni-la, evitá-la ou melhorá-la.

VI. Diagnóstico pré-natal – permite a detecção de doenças genéticas ainda durante a gravidez. Ele antecipa, aos casais, o conhecimento da saúde genética do feto e permite opções de conduta.

VII. Obtenção, em grande quantidade, de proteínas úteis aos seres vivos, inclusive ao homem. Entre as quais, citamos: insulina, hormônio do crescimento, gonadotrofina humana, interferons, fatores de coagulação do sangue, antitrombina, albumina sérica humana e fator de necrose tumoral.

VII. Terapia gênica (geneterapia).

TERAPIA GÊNICA (GENETERAPIA)

A terapia gênica é o reparo ou substituição de um gene defeituoso visando o tratamento e a cura de uma doença genética. Ela já foi usada com sucesso na correção da Síndrome de Imunodeficiência Congêntica, provocada por mutações no gene codificador da enzima Adenosina Deaminase (ADA) e na Fibrose Cística (também conhecida como Mucoviscidose), causada por mutações no gene codificador da proteina CFTR (Cystic Fibrosis Transmembrane Regulator/regulador de condutância transmembranar de fibrose cística), que intervém na produção de suor, dos sucos digestivos e dos mucos. O gene que codifica a proteína CFTR está situado no braço longo do cromossomo 7. Milhares de pacientes já se beneficiaram da geneterapia, que tem vislumbrado novos horizontes visando o tratamento ou mesmo a cura de doenças graves. Conquanto alguns sucessos já tenham sido obtidos, muita pesquisa ainda precisa ser feita, principalmente no que diz respeito ao desenvolvimento de vetores de clonagem seguros para transporte dos genes de interesse. O custo, ainda elevado dessa terapia, torna-a pouco praticável, nas condições atuais.

Embora, teoricamente, seja possível transformar tanto células somáticas quanto células germinativas, a terapia gênica feita atualmente em humanos trabalha com correção das células somáticas (terapia gênica somática), proporcionando resultados satisfatórios aos pacientes, sem afetar, contudo, os genes das gerações futuras. A capacidade de corrigir defeitos genéticos ao nível da linhagem germinativa (terapia gênica da linhagem germinativa), conquanto seja tecnicamente viável, suscita, por ter a propriedade de alterar o conjunto gênicos das gerações futuras, uma série de questões éticas. A mais importante delas consiste em como evitar abusos potenciais da tecnologia, que pode, por exemplo, ser usada como parte de programas eugênicos para melhorar a constituição genética de indivíduos específicos ou até mesmo de grupos sociais.

Há, atualmente, receio de que a terapia gênica, que visa, inclusive, recuperar músculos afetados pela idade ou por doenças, como a distrofia muscular, possa ser usada por atletas de elite para aumentar o tamanho, a força e a resistência do músculo, constituindo-se o que se denomina doping genético. Chegará um tempo em que manipular o DNA será tão comum para obter uma melhora no desempenho competitivo, que não teremos mais olimpíada sem atletas geneticamente modificados. O doping genético pode ser obtido, adicionando-se ao músculo, através de um veículo transportador (vetor de clonagem), um gene sintético. Esse vetor leva o referido gene para o interior do núcleo, onde ele começa a “ordenar” que a fibra muscular produza grandes quantidades de substâncias que promovam as referidas alterações musculares.Em face de o produto gênico só ser encontrado no músculo, e não na urina ou no sangue, essa nova forma de doping, capaz de produzir atletas geneticamente alterados, não é detectável pelos métodos convencionais. Apenas uma biópsia, a princípio, poderia provar a presença do gene sintético, o que dificulta, sensivelmente, sua detecção pelas autoridades esportivas. Lembramos que, uma vez dentro da célula, o gene pode continuar ativo durante toda a vida celular.

Apesar dos problemas éticos e das dificuldades técnicas, num futuro próximo, uma ou duas décadas, a terapia gênica será uma arma valiosa para medicina combater uma série doenças genéticas. Para se ter uma ideia, há quem admita que, em algumas décadas, a vida humana possa ser prolongada até os 120 anos, em decorrência da manipulação de genes relacionados com o envelhecimento. Atualmente, vem sendo conduzida uma série de ensaios clínicos para avaliar a capacidade de a terapia gênica tratar diversas doenças de genes únicos. À medida que o mapeamento e o sequenciamento do genoma humano são completados, as terapias baseadas em genes podem se revelar como a última forma de medicamentos produzida pelo homem.

CLONAGEM REPRODUTIVA

Além da clonagem gênica, aqui mencionada, que consiste, em última análise, na produção de vários pedaços idênticos de um trecho de DNA inserido, via de regra, numa bactéria, devemos considerar, também, outro tipo de clonagem que consiste na produção de um organismo inteiro. Como exemplos, citamos ovelha Dolly, clonada a partir de uma célula extraída da mama de uma ovelha adulta e a bezerra Vitória, primeiro mamífero clonado no Brasil, originada a partir de célula embrionária, extraída de um embrião de cinco meses, que não chegou a nascer. O nascimento de Dolly foi anunciado em fevereiro de 1997, e o de Vitória, em 17 de março de 2001.

Como a ovelha doadora de célula para a clonagem de Dolly já tinha seis anos na ocasião do procedimento e em função do processo de envelhecimento celular, que leva ao acúmulo de mutações e alterações celulares, Dolly já nasceu, do ponto de vista biológico, com seis anos de vida. Nasceu, portanto, prematuramente velha. Outra preocupação dos pesquisadores que clonaram Dolly dizia respeito a sua fertilidade. Ela, entretanto, deu nascimento a quatro ovelhas, a primeira em 1998 e as três outras em 1999, demonstrando que o animal clonado não era estéril e podia se reproduzir sem maiores problemas.  Por outro lado, enquanto a maior parte das ovelhas vive entre o onze e o doze anos, Dolly morreu com apenas seis anos e meio, após ter começado a manifestar, prematuramente, doenças frequentemente associadas à velhice. Em janeiro de 2002, por exemplo, foi anunciado que Dolly apresentava sinais de artrite no quadril e nos joelhos, doença que, embora seja comum nas ovelhas velhas, costuma aparecer em uma idade mais avançada. O animal foi sacrificado após a descoberta de sinais de uma doença pulmonar progressiva.

CLONAGEM TERAPÊUTICA

A clonagem terapêutica (terapia por transplante nuclear ou técnica de transferência nuclear) é um tipo de clonagem, que tem como objetivo a obtenção de células-tronco embrionárias. Ela descortina a possibilidade de, no futuro, uma pessoa poder “reparar” defeitos no organismo usando suas próprias células. Nessa clonagem, um núcleo somático do paciente é transferido para um óvulo enucleado que, em condições adequadas de cultura, origina um “embrião”. Este, cultivado in vitro até um estágio do desenvolvimento embrionário denominado blastocisto, é dissociado para a obtenção das células tronco-embrionárias. Dessa forma, o blastocisto não é implantado. Ele serve apenas como uma massa de células que podem ser consideradas células-tronco de alta versatilidade. Essas células-tronco podem ser usadas para restaurar a função de um órgão ou de um tecido, transplantando novas células para substituir as perdidas pela doença, bem como substituir células que não funcionam adequadamente devido a diferentes causas (defeitos genéticos, lesões da coluna cervical, acidente vascular cerebral, doenças sanguíneas, etc.). Lembramos que as células-tronco adultas não possuem a capacidade de se transformarem em qualquer tecido, sendo, portanto, menos versátil que as embrionárias.


Respostas

  1. Esse texto publicado sobre clonagem gênica está excelente, principalmente pelo seu caráter essencialmente esclarecedor.

  2. O texto está excelente! Parabéns profº,me esclareceu algumas dúvidas.

  3. Excelente material! Mais esclarecedor do que muitos livros… aliás.. dos que eu li, todos perdem para este material. Parabéns e obrigada por disponibilizar materiais como este gratuitos na internet!

  4. Amei o BLOG,dica do meu professor Adeíldo.Muito exercício para treinar,encontrei assuntos difíceis de serem bem explicados nos livros.Adoreiii

    • Prezada Caroline
      Todos os exercícios constantes do nosso blog foram de vestibulares realizados no Brasil. Sou adepto da elevação do nível das provas aplicadas nos vestibulares.
      Sucesso
      Djalma Santos

  5. Mais uma vez, parabéns por disponibilizar excelentes materiais àquelas pessoas que não tiveram oportunidade de tê-los.

  6. Excelente material. Parabéns e obrigada Professor!

  7. Excelente!!!

  8. Parabéns prof. O texto sobre clonagem genica está muito claro e objetivo. Ótima fonte para preparar minha aula! Obrigada! Estamos precisando de professores assim na internet que postem os assuntos de maneira coerente.

  9. Gostaria de me fornecer materia acerca de:representacao esquematicamente os processos basicos da expressão genica.

    • Prezado Antônio
      Ver relação abaixo (TODOS PUBLICADOS NESTE BLOG):
      I. DNA: DEPÓSITO DAS INFORMAÇÕES GENÉTICAS.
      II. EXPRESSÃO DA INFORMAÇÃO GENÉTICA.
      III. OPERON.
      IV. EVIDÊNCIAS MOLECULARES DA EVOLUÇÃO.
      V. MUTAÇÃO GÊNICA.
      VI. REPARO DO DNA.
      VII. RIBOZIMA (RNA SUPER STAR).
      VIII. RNA ANTISSENSO.
      IX. PLASMÍDEOS.
      X. SÍNTESE PROTEICA.
      XI. SPLICING (PROCESSAMENTO DO RNA).
      XII. CROMOSSOMOS GIGANTES.
      XIII. CLONAGEM GÊNICA.
      XIV. CONJUGAÇÃO BACTERIANA.
      XV. TRANSFORMAÇÃO BACTERIANA.
      XVI. TRANSDUÇÃO BACTERIANA.
      XVII. CICLO CELULAR.
      XVIII. TELÔMERO.
      XIX. CONTROLE DA PROGRESSÃO DO CICLO CELULAR.
      XX. CÓDIGO GENÉTICO.
      XXI. DUPLICAÇÃO DO DNA.
      Djalma Santos


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